Texto escrito em 2015 Não gosto muito da palavra escrita porque o tom da narrativa é dada por quem a lê, o que pode dar uma interpretação equivocada. Saiba que a voz é de pesar, de quem narra uma história triste. Toda a família do meu pai, pai dele (meu avo), tios, avos eram graduados do exército alemão. Há fotos na família com outros amigos também militares que eram judeus e que também eram graduados no exército. Minha avó contava que com a situação econômica cada vez mais difícil depois da Primeira Guerra, durante os anos 1920, pessoas trocavam de emprego para ganhar menos, porque mesmo pagando menos, determinados empregadores pagavam diariamente ao meio-dia, no lugar dos outros que pagavam no final do dia, o que podia fazer uma grande diferença, pois o dinheiro do meio-dia comprava mais do que mais dinheiro no fim do dia. As pessoas saiam para comprar qualquer porcaria, uma cadeira, um tapete velho, que na hora do escambo poderia ser utilizado. Nessa época começou a emergir um certo “camarada” com discurso arrogante e inflamado dizendo que iria colocar ordem na casa. O povo desesperado se agarrou ao que poderia ser uma tábua de salvação. O maluco “limpou” até as forças armadas e mandou prender até os oficiais do exército que eram judeus!!! Muitos dos amigos do meu avo, que combateram com ele ombro a ombro nas trincheiras, não eram mais considerados "alemães" e desapareceram para sempre! Os recursos que minha família e todo o povo alemão tinha em bancos foram confiscados para financiar a guerra. Fala-se muito da opressão do povo judeu, mas poucos fazem ideia do que era ser alemão não nazista vivendo sob esse regime, mesmo sendo oficial do exército. Depois vieram os “camaradas” russos para “libertar” o povo oprimido. O som das ruas foi trocado do barulho das bombas para os gritos de centenas de mulheres sob os braços de seus estupradores. Eram violentadas não uma, mas seis, dez, vinte vezes. Faziam parte do despojo da guerra, tomadas pelos conquistadores. Os soldados de Hitler tinham feito o mesmo ao conquistar outros países. Frutos das atrocidades, crianças indesejadas foram concebidas no medo, em meio à violência e nascidas do horror. Metade de todas as mulheres em Berlim foram estupradas e 10 porcento delas pagaram pelas involuntárias conjunções carnais doenças venéreas. Em 1953 meu pai tinha apenas 20 anos, mas era um jovem seduzido pelo ideal do comunismo e um engajado ativista. Com o Muro de Berlim sendo construído pelos "camaradas" soviéticos, não demorou a perceber que, em breve, seria um prisioneiro do próprio regime. Toda a família foi emigrando aos poucos, discretamente, para o lado ocidental, deixando casas, amigos e todos os pertences para trás. Ao se tornar desertor da marinha, não se sentia mais seguro em seu país e nesse mesmo ano desembarcou completamente só no porto de Santos, para iniciar uma nova vida. No fim de 2014, tentando me encontrar, literalmente fugi com uma mochila nas costas por algumas semanas para a Alemanha, foi minha primeira vez na Europa. Mesmo meio sem rumo, visitei Berlim, Dresden, Budapeste na Hungria e Praga na República Checa. Com pouca grana fiquei em albergues e em todos eles tinha um negócio legal: pelas 8 da manhã passava por lá um guia oferecendo uma free walking tour. Geralmente eram jovens locais estudantes de história que te levavam para uma caminhada turística de algumas horas, no final, cada um colaborava com 5 ou 10 euros, voluntariamente. Além de histórias interessantes, contavam o que era a vida deles quando os “camaradas” estavam no poder. Quem não viveu lá, não faz ideia o que era a vida dos países da cortina de ferro. A visão romântica da foice e do martelo representa o campo e a indústria. Na vida real, o martelo era usado para te enfiar filosofias falidas e mentiras na cabeça, caso você não aceitasse, a foice dava cabo do resto. Para não falar que não existia ninguém progredindo, existiam alguns ricos que comandavam o país e TODO o povo era pobre. Só em 1989 a Checoslováquia recuperou a liberdade e, para citar apenas um exemplo, a guia nos contou que um amigo dela, em 1985, obteve uma licença “especialíssima” para visitar a parte ocidental da Alemanha e ele voltou espantado, “parece que lá é natal todos os dias, as pessoas andam pela rua sorrindo”. Ele aproveitou também para fazer uma extravagância, comprou uma iguaria, algumas dúzias de banana, infelizmente foi barrado pelos “camaradas” na fronteira, ele não poderia entrar com as bananas sob a alegação de que pretendia vende-las no mercado negro. Que sabe o saciado do faminto? Que regime é estúpido o suficiente para crer que ao interromper a oferta acabará com a demanda? Aguentou comer quase uma dúzia, o resto ficou retido com os “companheiros” que depois se encarregariam de vender no mercado negro eles mesmos. Por isso, a guia nos pediu paciência com os mais velhos e que compreendêssemos a sua sisudez, pois era um povo que, de tão mal tratado, tinha perdido a capacidade de sorrir. As pessoas, depois de serem tolhidas, vigiadas e terem seus pensamentos castrados por décadas, quando receberam a liberdade não sabiam ao certo o que fazer com ela. Perderam a dinamicidade, o instinto – como animais em cativeiro que não sabem mais como caçar. Para ter entusiasmo pela liberdade de pensamento temos de aprender primeiro que essa liberdade é algo a ser cultivado e respeitado. E não crescer considerando isso um crime. No socialismo, as pessoas comuns, sem exceção, são niveladas por baixo e igualadas pela pobreza, falta de esperança e falta de ambição porque não há chance de prosperar. Livres de um regime decrépito e falido, essas cidades que visitei, que faziam parte da cortina de ferro, transpiram pujante prosperidade, desenvolvimento, integração com a cultura mundial, progresso econômico, e, sobretudo, valorizam a liberdade da qual foram privados por tanto tempo. Veja, muitos acreditam que o capitalismo seja o verdadeiro satã que oprime os fracos e oprimidos, por outro lado, geralmente essas pessoas têm uma simpatia pelo comunismo recalcado que faliu no mundo inteiro e impediu o desenvolvimento de suas nações por décadas e mais décadas, cobrando um preço alto demais de várias gerações de seus pobres habitantes. Vejo militantes e comunistas virtuais famosos como Niemayer e vários artistas de renome, de dentro de suas confortáveis mansões defenderem a ditadura do “camarada” Fidel. Mas morar lá ninguém quer, não há espaço para esses artistas cantarem suas músicas de protesto e proclamarem seus discursos sobre direitos humanos lá. São turistas na revolução que depois voltam para sua vida de opulência e fartura. Qual deles estaria disposto a abrir mão para vivê-la de verdade? É possível ser rico e socialista, mas só virtual e intelectualmente. Muitas pessoas só querem ver o preto e o branco, eu também vejo, mas entre essas duas cores vejo uma infinidade de tons de cinza. Cuba não é o que é só por culpa do “imperialismo impiedoso”, acredite. Os partidos socialistas e outros movimentos de esquerda na América Latina “traduziram”, por influência da Revolução Cubana, o termo camarada para companheiro. “Eu não tento mais explicar para as pessoas porque amo pilotar uma motocicleta. Para aqueles que entendem nenhuma explicação é necessária. Para aqueles que não entendem nenhuma explicação é possível.” (Ardys Kellerman) Pelo mesmo motivo não costumo debater ideais políticos. Radicalismo de qualquer tipo logo me lembra um certo psicopata de bigodinho que chegou a ter 82% de aprovação de um povo culto, por isso eu via a paixão exacerbada do PT e seus militantes com muitas reservas. Primeiro veio a oposição burra que passaram a fazer para minar as coisas que "não é de interesse do partido" não importando se estivessem prejudicando o país. Quando o companheiro Lula chegou ao poder, eu esperava muitos erros por incompetência, privatizações paternalistas - que felizmente não aconteceram -, inchaço da máquina pública com a criação de cargos e cabides de emprego - como aconteceu -, mas teve uma coisa que realmente me desapontou e que jamais esperava que viesse de quem atirava tantas pedras, a corrupção escancarada e desavergonhada – em todos os níveis. Endêmica, não só deles. Esperava que prejudicassem o país por inaptidão e ignorância, mas nunca de forma intencional e tão explicita. De certa forma ficaram órfãos os idealistas que cegamente acreditavam num partido que estivesse acima da política mundana. Imagine, se quem era extremamente contra tudo mostrou-se pior que os mais corruptos já vistos, quem sobrou para dar um lampejo de esperança para as pessoas de bem? Estranhamente existe um séquito que vive no planeta da estrela vermelha em que tudo está bem, notícia ruim é coisa da mídia imperialista, como não assistem às críticas, tudo está bom. No planeta que eu vivo, no ano de 2015, a inflação está alta, o número de desempregados está aumentando a cada dia, o dólar esta na estratosfera, o crescimento do PIB foi nulo, o progresso é pífio e a roubalheira é generalizada. A vida melhorou? Sim, não sei se foi graças a Deus, ao belzebu, ao Papa Francisco, ao Lula, à Dilma ou ao porto de Cuba, mas melhorou - principalmente para os mais pobres (graças ao Bolsa Escola, agora rebatizado, que foi duramente combatido pelo PT na época de sua implantação). Ótimo! O problema é que os “mais ricos”, que viabilizam e sustentam os programas sociais desse “progresso todo”, estão cada vez mais pobres e agora vão ter de engolir mais um aumento nos encargos da folha de pagamento para diminuir o rombo causado pela corrupção e incompetência do governo. Mas o governo fez a sua parte! Cortou 12 bilhões na SAÚDE, 9,5 bilhões na EDUCAÇÃO, mas custou muito a diminuir alguns ministérios. Não, não sou contra o governo, eu torço por ele, preciso desesperadamente que dê certo, que prospere, para que eu prospere junto. Não sou contra o PT, sou contra a roubalheira – sou anti-ladrão, sou a favor do Brasil. Não escondo a admiração que tenho pelo homem FHC, quem ler "A soma e o resto" vai entender. Salvou o Brasil da hiperinflação, o que não significa muito para os que nasceram depois de 1985, porque não têm noção de como era viver naquela situação de caos. Só para se ter uma ideia, no final de julho de 1993 uma nota de cem mil cruzeiros não era suficiente para pagar meio litro de leite. Mesmo assim, isso não me cegava e quando apareciam escândalos ou eram cometidos erros no governo dele, eu me envergonhava, não sabia onde enfiar a cara e queria que tudo fosse solucionado de uma forma correta. Atualmente, "está tudo certo", argumentam que os podres só estão aparecendo porque esse governo está apurando e “todos” estão sendo “punidos”. Depois, se não tiverem mais argumentos, dizem que os outros também roubaram, como se um erro justificasse o outro. Quando uma notícia vexatória é divulgada com insistência dizem que a imprensa está contra e fica requentando notícia velha. Será que se a notícia fosse sobre um opositor eles teriam a mesma postura? É inegável que o Lula é um grande líder e tem qualidades, mas vejo nesse “companheiro” também um animador de plateias que gosta de bravatas, arrota arrogância para todo lado, é rancoroso, pedante, vive cuspindo no prato que comeu, não sabe perder e quando se vê acuado faz ameaças absurdas como a de pôr na rua o “exército” do João Pedro Stedile, líder dos Sem Terra, invasor de propriedades alheias, incentivador da desobediência civil. Além de arruinar anos de trabalho destruindo laboratórios de pesquisa agrícola, é um sujeito perigosíssimo e com enorme tendência ao terrorismo. Isso, na minha opinião, não é postura de um estadista. FHC disse certa vez que Lula sofre de incontinência verbal, sou obrigado a concordar. Um “companheiro” na posição dele já deveria ter aprendido a pensar antes de falar certas bobagens. Pelo histórico de minha família e minhas experiências, vejo com preocupação a grande simpatia que o partido tem por ditadores de países e filosofias falidas como Hugo Chaves / Nicolas Maduro - Venezuela, Evo Morales - Bolívia, Raul e Fidel Castro - Cuba, e até o temerário presidente do Irã Mahmud Ahmadinejad – todos eles muito mal vistos pelo mundo civilizado que é nosso maior freguês. Estão instalando lá a ditadura, cerceando a liberdade de imprensa, submetendo seu povo a enormes privações e afundando seus países. Acrescente ao grupo a Argentina que viveu com Cristina Kirchner um perrengue daqueles. Acho perigoso e não compreendo quando pessoas colocam paixões acima de qualquer coisa (leia-se futebol, religião, política ou qualquer outra coisa), apontando só os outros sem fazer uma análise da sua própria convicção. Qualquer coisa que turve a sua visão, qualquer tipo de radicalismo me preocupa e me faz lembrar do poder da retórica daquele monstro que foi visto como salvador da pátria na Alemanha. Por isso, torço sempre para que as pessoas nunca percam a sua capacidade de discernimento. Mesmo que absolutamente convictas, ainda consigam examinar fatos com isenção e que estejam prontas para mudar, se necessário. Ninguém está sempre certo ou sempre errado. Lamento se vou contra ao que outras pessoas acreditam ou que ofenda a quem me lê nesse momento. Escrevi este texto para um amigo que considero muito e que talvez tivesse uma ideia deturpada a meu respeito. Não estou tentando mudar o ponto de vista de ninguém, dizer que estou certo e outro errado. Não! Estou apenas tentando justificar o porque de eu ver algumas coisas dessa forma. O porque de o socialismo e os termos “camarada” e “companheiro”, que tem forte conotação política, representarem algo muito negativo para mim. Mudando de pau pra cavaco, mas nem tanto, os filmes "A vida dos outros", "Dresden O Inferno" e "O Leitor" dão uma mínima noção de algumas coisas que falei. Quando estive em Berlim, por acaso era a comemoração dos 25 anos da queda do muro, em vários lugares tinha telões que mostravam um filme de uns 25 minutos que mostrava a história do muro, desde o início de sua construção até a queda. Muito pesado, mas muito interessante e instrutivo, me levou às lágrimas várias vezes, infelizmente não consegui encontrá-lo em lugar nenhum... Se tiver algo a dizer sobre meu texto ou sobre suas convicções, por favor não se acanhe, meu e-mail está abaixo. Abraço Ricardo |