Feriadão de 15/11/2013 O objetivo desse passeio era visitar algumas das
serras mais legais do Brasil: Rastro da Serpente, Rio do Rastro e Serra da
Graciosa.
O primeiro destino era Jaraguá do Sul, SC, onde
encontraríamos o amigo Jaci, uma puxada de mais de 600 quilômetros. Nos
agrupamos no primeiro posto da Castello Branco e entre 8 motos big
trail havia uma intrusa ao quadrado, eu explico, entre vários marmanjos
havia uma mulher pilotando - Sephora, e ainda por cima ela montava um torpedo de
162 cavalos, em média 62% mais potente que nossas máquinas, era uma Ducatti
Diavel. Nós ainda não sabíamos, mas ela estava para entrar
em uma das maiores roubadas da vida dela. Ela seria forçada a pilotar em curvas
de alta velocidade, curvas muito travadas, na terra, na brita, no cascalho solto
e no paralelepípedo molhado, mas estes feitos não seriam nada. Enquanto os
marmanjos desse passeio geralmente tinham suas motos equipadas com duas malas
laterais e top case para acomodar a bagagem necessária para alguns dias, a
grande proeza dessa moça foi carregar apenas uma mochilinha mínima amarrada no banco do garupa, com tudo o que ela iria precisar, incluindo material de
beleza. Realmente impressionante! Eu sei o que vocês estão pensando, mas estão
enganados, ela gosta de pessoas do sexo oposto.
Como não podia deixar de ser num feriado, já às
5:30 da manhã a Castello estava completamente parada, saímos em Sorocaba e a
Rod. Raposo Tavares sentido Itapetininga estava boa.
Rastro da Serpente
Pegamos sentido Capão Bonito, que já faz parte do
"Rastro da Serpente". Quando vi uma placa alertando para "Curvas acentuadas nos
próximos 83 km" abri um largo sorriso em baixo do capacete - vai começar o
rock'n'roll. E de vez em quando aparecia uma placa "Cuvas perigosas à frente",
mais ainda? Me perguntava.
O Rastro da Serpente se estende pelo estado de São Paulo e do Paraná, possui mais de 200 quilômetros de MUITA curva, são mais de 1.200 curvas - um lugar bom para o cara pegar o jeito ou desistir e comprar um carro. Já havia feito a parte de São Paulo à noite e com neblina, mesmo nessa situação desconfortável, não via a hora de voltar para ver a sua beleza de dia. O asfalto na parte paulista não estava muito bom, mas quando se entra no Paraná, fica excelente e o visual é ainda mais bonito, no entanto, a pista não possui um palmo de acostamento e qualquer distração cobra seu preço. Outro perigo são grandes caminhões que carregam madeira ou carga para as cimenteiras, eles andam muito devagar e entrar forte numa curva e dar de cara com um deles se arrastando na sua frente pode ser desastroso. Como o objetivo era chegar em Jaraguá do Sul ainda de dia, estivemos longe de andar na velocidade de turismo.
Quando olhamos uma moto com um apelo futurista como o da Diavel é natural que se tenha uma certa desconfiança quanto a praticidade da moto, já que muitas motos de apelo visual forte são problemáticas quando utilizadas para fins diferentes do de apenas desfilar e chamar a atenção. Com a roda traseira superlarga, um motorzão de cavalaria absurda empurrando, imaginava que seria uma dragster na arrancada mas ruim de curva. Todos sabem que as big trail são muito boas também de curvas, mesmo assim, tanto em curvas de alta quanto nas bem travadas, a Ducatti estava sempre ali pertinho.
Quando saímos de Curitiba, sentido a BR-101, pegamos um congestionamento monstruoso até a praça do pedágio que estava entupida. A falta de visão das autoridades é inacreditável, poucos metros após o pedágio, as duas faixas da pista se transformavam em uma, pois a outra estava em manutenção por alguns poucos metros, transformando uma situação já normalmente caótica em algo inominável. No dia seguinte passeamos um pouco por Jaraguá do Sul, depois pegamos uma estrada de brita que nos levou à praia. Beirando a praia pegamos um caminho de areia muito fofa. O segredo de andar bem nesse tipo de terreno é andar acima de 50 por hora e de preferência com a calibragem do pneu baixa. Estava até me tornando mais confiante, usando bastante a terceira marcha, mas na minha frente a moto de um colega afundou a roda dianteira e derrubou seu condutor, me acovardei, por enquanto acho melhor andar atolando devagar e cair devagar do que correr o risco de cair depressa. Outros dois colegas caíram nas mesmas condições, por sorte, nada sério ocorreu, além do orgulho ferido e de algum prejuízo material. Prudentemente, Sephora foi de garupa nesse dia.
Fomos até São Francisco do Sul, uma cidade muito legal, com prédios históricos e um centro bem cuidado.
Fizemos um passeio de balsa e retornamos por Joinville. O tempo estava ameaçador e várias vezes chegou a cair uma garoa grossa, por fim, choveu. Para piorar, o trânsito era sempre intenso e as vias de mão dupla.
Serra do Rio do Rastro
No domingão, dia 17, foi dia de visitar a tão esperada Serra do Rio do Rastro, mas antes queríamos passar por Urubici. Em algum lugar acabamos pegando um caminho errado e quando o asfalto acabou, segundo um morador local, tínhamos duas opções, fazer uma volta de uns 100 quilômetros ou seguir pela estrada de terra por uns 30. Sephora fez algumas perguntas quanto ao estado da estrada e valentemente determinou que seguíssemos em frente.
Acho que foi a primeira vez que uma Diavel fez um off road. Subimos a Serra Grande, que apesar do nome tinha apenas uns três quilômetros de subida. Muito bonita, mas todos estávamos muito preocupados com a dificuldade da Sephora em conduzir a Ducatti no meio de brita, buracos e muito cascalho solto.
Quando chegamos ao topo, ela tomou a frente e pilotou bem mais depressa, deixando claro que estávamos preocupados à toa e devagar demais.
A estrada que leva até Urubici é linda, infelizmente não havia tempo para apreciar suas belezas naturais, apenas passamos por ela e a Serra do Corvo Branco teve que ficar para uma próxima vez.
O destino seguinte era Bom Jardim da Serra, o topo da Serra do Rio do Rastro. Ao chegar no topo, me senti como quando se está no topo da montanha russa, apesar de eu detestar montanha russa, foi a melhor comparação que encontrei, pois sabia o que me esperava e a emoção de estar andando com minha moto numa das mais belas serras do mundo seria grande. O céu estava azul, a serra toda iluminada pelo sol, o verde exuberante, as montanhas de pedra, a estrada travada serpenteando as encostas íngremes. Quando tiver a chance, passarei o dia ali, subindo e descendo várias vezes, de dia, de noite, de bicicleta e de moto, até à pé vale muito a pena, mas não dá para mim. Não tínhamos muito tempo para o deslumbramento, o destino final do dia ainda estava distante, Florianópolis, o que daria quase 600 quilômetros rodados no dia. Sephora, com a estatura ideal, veste sua moto como se fosse sob medida e estava inteira para rodar mais. Quando a indaguei sobre o que ela achou da Serra do Rio do Rastro, as lagrimas vieram e contou-nos que estava realizando um sonho do marido que ela perdeu em 2010, num acidente tolo na Estrada dos Romeiros que fica perto de minha casa. A Serra passou a ter outro significado para nós.
Serra da Graciosa Acordamos na segunda cedo, com quase 700 km pela frente, logo no começo um congestionamento monstruoso, quando deu uma folga, apareceu um luminoso que alertava "Trânsito congestionado nos próximos 36 quilômetros". Apesar de dizerem que para moto não tem congestionamento, isso não é verdade, é extremamente cansativo e desgastante andar no corredor, principalmente com motos do tamanho da nossa, para não falar nos riscos. Seria uma pena passar na porta dela e não dar uma entradinha... Entramos, mas na aproximação a Serra da Graciosa mostrou-se envolvida num véu denso de garoa. Foi a vez do último desafio de nossa heroína. Sephora que já havia atingido 265 km/h na Diavel agora teria que utilizar de toda a sua sutileza para pilota-la com a máxima suavidade no paralelepípedo molhado. Não preciso dizer que tirou de letra. A serra que é um jardim muito bem cuidado, mesmo com o tempo ruim, com suas hortências sem flor, valeu a pena ser visitada.
Na verdade, no lugar de chamar esta página de "No Rastro das Serras", poderia ter chamado de "Desafio Diavel". Duvido que alguma revista de motociclismo tenha feito um test drive tão completo, que se aproximasse do que fizemos nestes quase 2.000 quilômetros em quatro dias com essa máquina surpreendente. Faltou apenas barro, mas aí já seria demais até para mim.
Pegamos a Regis Bittencourt que em São Paulo tem a Serra do Bananal. Apesar de ter seus encantos, dificilmente são notados, pois o trafego de caminhões é muito intenso e quando o trânsito pára, ele realmente pára, não tem corredor e se você for com a moto para a contramão você está morto, pois entre o caminhão que sobe e o que desce não sobra espaço nem para um homem de pé, andando de lado.
Destaques
A condução dessa nossa nova amiga é tão impressionante quanto sua moto, além de dominar todos os terrenos, anda numa regularidade incrível, enquanto eu e os outros se distanciavam e aproximavam da moto da frente como um elástico, ela mantinha sempre a mesma distância e parecia estar sendo rebocada por quem ia a sua frente.
O limite de uma pessoa pode ser completamente diferente do limite de outra, o que poderia ser considerado insano para um pode ser o natural para outro, e nesse patamar coloco nosso amigo "Dodo", que conduziu a sua Super Tenere com a esposa na garupa num ritmo que ninguém conseguia acompanhar sozinho. A explicação dele é simples, com mais peso a moto gruda mais no chão, por isso, pode andar mais... Para mim é simplesmente um talento que eu não tenho.
Destaque também para nosso líder, guia, fotografo e companheiro Cláudio. Seu irmão era o elo que fechava a corrente, mostrando-me o caminho quando eu exitava e me freando quando ameaçava tomar alguma decisão que poderia envolver algum risco, valeu Alessandro! Cavaleiros de sonhos
Uma moto grande numa estrada simboliza para muitos a liberdade, hoje estamos montados em nosso sonho, que é também o sonho de muitas pessoas pelas quais passamos nas estradas. Quando eu estava de carro na minha vidinha medíocre e via uma dessas maquinas fantásticas passar, tão distantes da minha realidade, por alguns instantes eu pegava carona naquele sonho e me imaginava alçando vôo com ela. Muitas vezes eu fazia um aceno e a simples retribuição tinha um significado muito especial, afinal, eu fora notado por alguém que para mim estava numa outra dimensão.
Quando se está num carro e caímos num congestionamento, muitas vezes o tédio faz com que a gente se distraia e fique mal posicionado na fila, ou simplesmente embicamos para ver se conseguimos enxergar o que está acontecendo ou se conseguimos vislumbrar o fim daquele pesadelo. Nesse momento pode acontecer de atrapalharmos um motociclista que vinha pelo corredor. Quem deliberadamente posicionaria o carro com o objetivo de realmente atrapalhar o motociclista? Se esse tipo de gente existe, provavelmente é tão mínimo que estatisticamente deve ser desconsiderado.
Num congestionamento monstro depois de Curitiba, um colega se desentendeu com um caminhoneiro mal posicionado. Eu era a quinta moto numa sequência de oito. Quando o colega partiu, o motorista esticou a mão pela janela em forma de revolver e "disparou" na cabeça de cada um dos motociclistas que veio na sequência. Todos passaram a ser alvos de uma discussão que nem sabemos qual foi, inclusive um que não fazia parte do nosso comboio. Portanto, na minha opinião, quando encontrarmos alguém que está nos atrapalhando, será muito melhor esperar que ele desocupe a passagem (de qualquer forma não há outra alternativa) e depois lhe dar um aceno de agradecimento, conquistando a sua simpatia ao invés de ganhar um novo inimigo. No corredor, se ele te odeia ou não, faz pouca diferença, já numa rodovia em alta velocidade pode ser a diferença entre a vida e a morte. Certa vez, tive acesso a todos os integrantes da banda Deep Purple, se pedirmos para alguém citar 5 bandas importantes dos anos 70, certamente essa será lembrada. Mesmo sendo celebridades, todos pousaram para fotos e deram autógrafos. Se tivessem se recusado, eu teria me decepcionado, o que criaria uma certa mágoa. Tentei agradecer a todos que se esforçaram para dar passagem, sempre, afinal sou quase um cavaleiro alado, montando um sonho coletivo, lembra? E não quero desapontar ninguém, quero que abram alas, pois tenho muito mais a perder que eles, quero que continuem sonhando e eu continuar a viver o meu. Quando comprei minha moto foi para satisfazer uma necessidade particular egoísta, nunca imaginei que ela iria me proporcionar tantos amigos novos de tamanha qualidade. Valeu pessoal!
A maioria das fotos são de autoria do Cláudio, mas tem fotos minhas e da Sephora também. Que venha logo o próximo rolê.
ô~ò
Ricardo Koetz |
´´ Perna de Pau >