Black Sabbath

Obs: as fotos são grotescas, a máquina é limitada, eu mais ainda, para ampliar as imagens as fotos foram tiradas do telão e não houve a preocupação de melhorá-las ou dar qualquer tratamento para aperfeiçoar o enquadramento, tem o mero objetivo de passar algumas vagas lembranças do show.
 
11/10/2013 - Campo de Marte

O período mais rico da história do rock vai até o início dos anos 70, pois nessa época ele estava entre a infância e a adolescência, em que tudo era permitido, não havia uma fórmula de sucesso rígida a ser seguida e as gravadoras ainda tinham uma influência menor sobre o que os artistas deveriam produzir. Esta liberdade e falta de modelos permitiam que as bandas desenvolvessem uma identidade própria.


No final dos anos 60 e início dos 70, nascia o hard rock e quando você ouvia Deep Purple, sabia que era Deep Purple, quando ouvia Led Zeppelin, apesar de cada disco ser completamente diferente um do outro e as músicas de um mesmo disco serem muito diferentes umas das outras, você sabia que era Led e isso acontecia com frequência entre as bandas dessa época, cada uma tinha uma identidade que as diferenciava e identificava. Dentro desse prisma de criatividade encontra-se, sem dúvida nenhuma, o Black Sabbath. Gosto de exagerar dizendo que se fosse possível alguém conhecer tudo o que foi feito no rock e não conhecer Black Sabbath, ele só conheceu a metade do que foi feito de expressivo.


À partir de meus 15 anos, quando já tinha a minha personalidade musical definida, reunia-me com outros amigos para consumir vinho barato e - no estilo do filme "Sociedade dos Poetas Mortos", onde, no lugar de trazer livros e proclamar poesias - cada um trazia suas pérolas musicais para serem ouvidas num volume razoável, apreciadas e discutidas por todos.


A sessão cultural se estendia por toda a tarde do domingo, mas um momento especial era aguardado por todos e que finalizava nosso encontro, era a sessão Sabbath. Deixávamos a sala e nos apinhávamos em meu quarto, fechávamos a porta e a janela para escurecer o ambiente, ligávamos o som no máximo volume, e cada um ficava livre para tocar seu instrumento imaginário preferido ou se alternar entre vários, cantando com Ozzy no embromation as partes mais fáceis das músicas à plenos pulmões, promovendo assim um rito de expurgo e libertação. Ao final, ascendíamos as luzes, lavados de suor, com os cabelos grudados no rosto e pescoço, despedíamo-nos leves e sorridentes, já planejando o próximo encontro.


Finalmente, depois de mais de 35 anos era chegada a hora de assistir ao Black Sabbath com sua formação original, exceto o seu baterista. Os ingressos haviam se esgotado em poucas horas quando colocados à venda meses atrás, o que gerou uma especulação muito grande e os ingressos passaram a ser vendidos a preço de ouro, para se ter uma idéia, meu irmão vendeu o dele e com o dinheiro foi de avião à Belém do Pará para pescar por uma semana.
 

Shows pagos promovidos em arenas, parques, joquei clubes, autódromos e, desta vez, aeroporto, tem uma finalidade principal, ganhar dinheiro socando o maior número de gente possível no lugar. Apesar disso, geralmente existe uma área reservada para o estacionamento de pessoas com dificuldade de locomoção, mas dessa vez, apesar de existir uma área grande de estacionamento junto ao evento, era só para quem conseguiu comprar o ingresso hiper mega maxi plus plus mais fodão, o cadeirante que viesse dirigindo seu carro deveria ter passado uns meses antes fortalecendo os braços na musculação para ir estacionar na conchinchina, rodar várias quadras no meio da rua até atravessar as quatro faixas da Santos Dummont com tráfego intenso, escalar os 20 centímetros de guia do canteiro central, fazer um off road na grama fofa, descer do outro lado, atravessar a segunda via da Santos Dummont com mais 4 faixas e depois se virar na calçada irregular e esburacada para chegar no portão, em resumo, ou vira atleta ou não assiste.


Já havia visto várias vezes o Megadeth que nunca me entusiasmou e ia abrir o show. Me despi de qualquer preconceito e fui querendo gostar do que iria ouvir, mas continuei com a mesmo opinião, a voz de Dave Mustaine, fundador da banda após ter sido expulso do Metallica, me soa forçada e os solos desconexos. Mesmo assim, conquistou minha simpatia ao se despedir e desejar que guiássemos com segurança para casa. Gostei de Symphony of Destruction mas estranhamente não tocou Seek and Destroy, dos tempos do Metallica e, na minha opinião, obrigatória.


Pouco antes das 21 horas o show começa com War Pigs e Ozzy Osbourne agradece os aplausos com o tradicional "God bless you all, thank you". Em seguida anunciou Into the Void. É claro que podiam tocar até o amanhecer e só teríamos ouvido clássicos, até mesmo as músicas tocadas do disco novo caberiam facilmente entre os discos lançados nos anos 70 - todos clássicos. Gostei muito de N.I.B., Snowblind, Black Sabbath, Fairies Wear Boots, Children of the Grave, mas gostei principalmente de Dirty Women, além de ser um sonzão, não esperava que fosse executada.
 

Apesar de Tony Iommi, o maior criador de riffs da história, estar lutando contra um câncer, seus solos continuam precisos e a apresentação de toda a banda poderia ser resumida numa única palavra: profissionalismo.
 

Em sua juventude o canhoto Iommi perdeu a ponta de dois dedos, no detalhe acima é possível ver as próteses que ele utiliza.
 

A qualidade do som estava boa e todas as músicas foram executadas com maestria, a voz de Ozzy estava ótima e ele continua um bom entertainer, sempre abençoando "God bless you", procurando agitar "Oô oô oô..." e provocar "I can't hear you", no entanto, os músicos poderiam estar tocando cada um em um continente separado, e suas imagens transferidas em forma de holograma para o palco, talvez assim teriam interagido mais. Estava cada um em seu quadrado e em momento algum os músicos se aproximaram para fazer um solo juntos ou interagir de alguma forma, Ozzy era o único a andar de um lado para o outro e em alguns instantes trocou olhares com Tony. Deu a impressão de estarem ali para bater o ponto e nada mais, não transpareceram nenhum prazer em tocar com o colega da banda ou coisa parecida. Achei a apresentação fria. Até Ozzy estava bem comportado, limitando-se a jogar água apenas em sua própria cabeça.
 

O baterista original Bill Ward, segundo ouvi falar, havia "desaprendido" a tocar as músicas do Sabbath e levaria muito tempo para entrar em forma de novo, por isso, as baquetas foram assumidas por Tommy Cufletos que atualmente é da banda de Ozzy e que tem em seu currículo trabalhos com Ted Nugent, Alice Cooper e Rob Zombie. É do tipo que gosta de gestos exagerados, levantar o braços acima da cabeça para descer a porrada, mas é um virtuoso no instrumento. Na verdade, se Bill estivesse na Banda, a nossa turnê teria sido cancelada, pois recentemente foi submetido a uma cirurgia devido a uma diverticulite perfurante - teve a parede do intestino perfurada por problemas gastrointestinais.
 

Depois de quase duas horas de show, voltaram para bis com Iommi fazendo a introdução de Sabbath Bloody Sabbath, mas eu sabia que deveria ser um blefe, pois Ozzy não consegue mais cantar essa música há muito tempo. Dito e feito, fecharam o show com a inevitável e obrigatória Paranoid.


Um de meus baixistas preferidos, impressiona a forma como ele ataca o baixo com seu dedilhando em velocidade. Curiosidade: no show do Rio o baixista Geezer Butler não voltou para agradecer o público no fim do show, pois estava vomitando no backstage, se desculpou pela rede social explicando que pegou algum tipo de vírus.


À lamentar? Várias coisas, preços exorbitantes que começavam nos poucos estacionamentos disponíveis, flanelinhas extorquindo R$ 30,00 para o carro ficar "em segurança" na rua, passando pelos ingressos caros para péssimas acomodações, e chegando ao salgadinho a R$ 12,00; banheiros químicos; metrô Carandiru que fechou cedo demais; para um público de 70 mil pessoas deveriam ter escolhido um estádio; antes de o show começar, um CD ao vivo do ACDC foi executado inúmeras vezes, deixando de saco cheio até quem era fã da banda; número de seguranças insuficiente; etc, etc. Havia duas áreas para deficientes (politicamente correto: PNEs - portadores de necessidades especiais), uma no setor Premium e outra na Pista, as duas ficaram lateralizadas, uma atrás da outra, separadas por um corredor de isolamento, como não havia cadeiras para todos os acompanhantes, eles ficaram de pé, na frente do setor de deficientes imediatamente atrás, prejudicando a visão dos mesmos, para piorar, acredite se quiser, o setor de trás foi invadido (!!!) pela multidão criando um tumulto enorme no meio do show, obrigando os bombeiros a retirar os deficientes (!!!) para garantir a integridade dos mesmos e depois tentar tirar os invasores, para depois voltar com os donos do lugar. Eu não notei o problema, mas foi relatado por um colega que assistiu tudo aterrorizado. Isso certamente estragou o show de muita gente.

Ricardo
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