Blues elétrico com pinta de rock - 16/08/1994 Bourbon Street
Certa vez ouvi, num programa especial sobre novidades, no rádio uma música de um tal de Duke Robillard, em que ele faz um dueto muito legal com uma garota. Como sou facilmente seduzido pelas vozes do "sexo frágil", fui logo anotando em minha listinha para comprar um dia. Dá pra imaginar a surpresa que tive ao chegar no Bourbon Street e ficar sabendo que ele ia se apresentar lá. Imperdível, é claro!
Como os shows sempre começam com pelo menos 45 minutos de atraso, resolvi chegar em cima da hora programada para o início, para que ainda tivesse tempo de sobra para escolher um drink estranho e coisas do tipo; mas a lei de Murphy é realmente implacável. A Globo e a TV Cultura estavam lá, e para que desse tempo para entrar com flashes ao vivo no programa Metrópolis, começaram pontualmente às 22hs. do dia 16/08/94. Sem problemas, ainda estavam tocando a primeira música, e para quem tinha uma quarta-feira cheia pela frente a antecipação foi uma boa.
O pessoal do Bourbon também estava agitado, pois tinham acabado de conseguir confirmar um show do trompetista de jazz Witon Marsalis, que estava fora da programação, para sexta-feira. Nem me arrisquei a saber do preço.
O som já agradou de cara! Era forte e com uma batida bem marcada pela bateria. Tocavam duas guitarras com som bem metálico, contrastando com o enorme baixo acústico. O som deles está entre o "blues alegrinho" e o Rock a Billy.
Entre uma somzeira e outra eu brigava com a minha caipirinha de frutas tropicais, que estava ótima, o único defeito é que no lugar do canudinho, deveriam ter dado uma colher, pois no fundo da taça de meio litro, estava uma enorme salada de frutas com morangos, kiwi, uva itália, maracujá, goiaba e outros bichos - cuja caroçaiada não cansava de entupir o canudo. Passei mais tempo soprando do que chupando.
Indubitavelmente era a melhor apresentação que eu já havia assistido no Bourbon. Deram destaque às músicas do álbum Temptation, que segundo Duke deverá ser lançado por aqui em setembro. O seu estilo às vezes se parecia com Ten Years After e outras por demais com Stevie Ray Vaughan.
Duke solava sentindo cada nota no fundo da alma, fazendo caretas e movimentos que lembravam o mestre B.B. King, enquanto a platéia urrava em êxtase. O
som nos envolvia de uma tal maneira que passávamos a fazer parte daquele swing rasgado. Ele parecia estar dentro da gente, balançando o corpo completamente fora de nosso domínio. Já passava das 23:30 quando, depois de um bluesão bem lento, começaram a tocar um som bem agitado no melhor estilo Vaughan; e quem roubou a festa foi
uma senhora, lá pela casa dos 50 e tantos, que, trajando bermuda e uma camiseta preta com o rosto de um blueseiro negro estampado não mais se conteve e começou a dançar chamando o pessoal das mesas da frente para participar da festa. Aproveitei o momento de distração da galera e o clima de vale-tudo para colocar os canudinhos de lado e cair de boca na "salada de frutas com vodka". Depois do bis, anunciaram que tinham CD's, vídeos e camisetas de Duke para vender no caixa, e que ele os autografaria. O preço dos CD's estava um pouco acima da média dos importados, mas afinal de contas, iria receber o autografo do autor, e além disso, eu teria dificuldades para encontra-los em outro lugar. Comprei o seu último CD, Duke's Blues (onde homenageia seus ídolos). Foi nesta noite que descobri que realmente conseguia arranhar o inglês, enquanto autografava, respirei fundo, me enchi de coragem e perguntei se esse era o que ele cantava com uma garota. No! That's another one, called "Turn it around" - uau, ele me entendeu perfeitamente-. Diabos! Pedi ao caixa o "Turn it around" e interrompi Duke no meio de seu jantar no camarote. Autografou este também, sem muitos sorrisos e com pinta de que já estava acostumado a essa rotina. Os outros componentes do grupo também estavam na mesa, mas fiquei meio sem jeito de pedir o deles também pois é possível que nem todos tivessem participado da gravação desses CD's, o que ficaria meio estranho.
No encarte do Duke's Blues o seu talento é atribuído à sua dedicação, que, a exemplo dos mestres Hendrix e Stivie Ray Vaughan, tocava de 12 a 14 horas por dia, que como eles, também chegou a ser encontrado dormindo ainda abraçado a sua guitarra e com os aparelhos ligados.
Existem shows que você assiste uma vez, gosta e sai satisfeito. Este, mesmo com mais de 2 horas de espetáculo, me deu uma vontade enorme de voltar nos dois dias seguintes. Você sai de bolso e alma leves... do tipo que não cansa nunca. Mas fui obrigado a me conter, uma vez que meu fundo especial para extravagâncias musicais já estava irremediavelmente avariado.
Além disso, economizar é preciso, pois no dia 27 - ao amargo sabor de R$ 25 para pista, R$ 30 para arquibancada e R$ 50 para enumeradas - haverá uma verdadeira maratona a ser enfrentada no estádio do Pacaembu. Se trata do Monsters of Rock.
Os shows começam as 14hs. com os grupos nacionais Raimundos, e os pesos pesados Dr. Sin, Viper e Angra (sendo que os três últimos cantam em inglê). Curiosidade: Viper chegou a emplacar em primeiro lugar no Japão, deixando para segundo o Guns'n' Roses. O Angra, cujo vocalista era do Viper na época, também vem fazendo sucesso por aquelas praias. Para as atrações internacionais vêm Suicidal Tendences, Black Sabbath (com sua formação original menos o vocalista Ozzy, prometendo tocar principalmente músicas dos 70), Slayer e Kiss. Imperdível também será o show que deverá acontecer nos dias 15 e 16 de setembro no Olympia com o monstro sagrado do progressivo Yes (não trará Steve Howe nem Rick Wakeman, mas virá com Trevor Rabin e Tony Kaye no lugar, além de Alan White e dos veteranos Jon Anderson e Chris Squire).
Outra coisa acontecerá nesta sexta dia 19/08 no Aeroanta, onde o veterano Made in Brazil fará um show comemorando os seus 25 anos de estrada, com vários convidados. Será lançado também um CD pela BMG com uma coletânea com os "melhores momentos".
Nos bastidores corre o boato de que Mick Jagger fez questão que a abertura do show dos Rolling Stones no Brasil no começo do ano que vem seja feito pela titia Rita Lee (amiga de Jagger).
Ainda bem que São Paulo pode nos oferecer algo a mais além de poluição, trânsito caótico, frio e violência. Temos mais é que fazer um esforço e aproveitar.
Ricardo Koetz
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