MONSTERS OF ROCK para Monstros da Resistência.
Estádio do Pacaembú, 27 de agosto de 1994. Palco de uma maratona de shows que apresentou 4 grupos nacionais e 4 internacionais.
Mais uma vez o pouco caso em relação a um público minoritário, mas que nem por isso deixa de merecer ser tratado dignamente, os deficientes físicos se viram em apuros. Como integrante dessa classe, e consciente das dificuldades de encarar um show dessas proporções, fui 3 vezes ao estádio e telefonei inúmeras vezes para saber se, conforme exige a lei, os deficientes teriam um lugar reservado para assistir ao show. Nas duas primeiras vezes que fui ao estádio, a organização de nada sabia. Na última e nos telefonemas seguintes, por má fé ou temor que alguém exigisse que a lei fosse cumprida, fui informado de que na pista haveria um local reservado, com cadeiras. No dia "D" ninguém sabia informar nada e ninguém era responsável por nada. A muito custo consegui me transferir da pista para a arquibancada, onde o ingresso custava R$ 5,00 menos. Infelizmente pessoas com cadeiras de rodas não tiveram a mesma sorte, pois não podiam escalar as escadarias, tendo que se contentar em apenas ouvir o espetáculo atrás das pessoas em pé no gramado.
Quem também saiu prejudicado, apenas financeiramente, foi o público das enumeradas que pagou o dobro do preço da arquibancada (R$ 50,00). O setor das enumeradas fica no mesmo patamar que as arquibancadas, a diferença fica por conta de uma cobertura que serve apenas como efeito psicológico, pois com o vento, em caso de chuva de nada adiantaria. O detalhe é que não tinha ninguém controlando o portão de acesso, ficando o trânsito entre arquibancada e enumeradas livre.
O Angra, abriu o show no horário marcado, e tocaram por meia hora. Fazendo um estilo "metal-progressivo" bem trabalhado, vocal agradável - quase lírico, tocaram sucessos de seu último disco, cujo som ao ar livre e sem os recursos do estúdio ficou um pouco vazio.
Tocaram também o Dr. Sin, que faz um hard rock mais no estilo dos anos 70; o Viper, tocando heavy metal que tem no currículo a façanha de já ter emplacado no Japão um 1º lugar das paradas, deixando para segundo, nada mais nada menos que, o Guns 'n' Roses.
Estas três atrações, apesar de brasileiras, cantam em inglês, deixando claro que pretendem alçar altos vôos. A outra atração brasileira foi a banda Raimundos, que fez uma barulheira infernal em que ninguém entendia nada, mas que para aquele clima de vale-tudo, até agitou o pessoal. Devo estar ficando velho.
A primeira atração internacional foi o grupo Suicidal Tendences. Fazem uma barulheira que mistura heavy metal com pitadas de Rap e outros bichos. Apesar de não fazer o meu estilo musical é preciso reconhecer o talento de seus músicos.
Já havia anoitecido quando entrou uma das bandas mais criativas do rock pesado dos anos 70. A união de Ozzy Osbourne (vocais), Tony Iommi (guitarra), Geezer Butler (baixo), Bill Ward (bateria) criou uma fórmula mágica que lhes permitiu produzir discos durante quase uma década, com variações de músicas e ritmos dentro de seu estilo, nunca antes vistas e jamais repetidas; comparável talvez apenas à versatilidade do Led Zeppelin. Com a saída de Ozzy, o Black Sabbath, perdeu um pouco de sua identidade mas sem perder a criatividade, e passou a fazer um som mais próximo do heavy metal. Pelo lugar de Ozzy passaram grandes vocalistas como Ronnie James Dio, Glenn Hughes e Ian Gillan (que, apesar de seu alto astral, sua participação deu origem a um disco extremamente denso - na minha opinião), mas quem está a mais tempo é Tony Martim. E foi com ele que o Black Sabbath se apresentou desta vez no Brasil.
Fizeram uma apresentação curiosa: tocaram basicamente antigos sucessos e músicas mais conhecidas, apenas uma música de seu último LP. Todos os músicos são excelentes, mas sem dúvida, o baixista Geezer continua sendo um fenômeno. Considerado um dos melhores do mundo, ao lado de Jack Bruce e Steve Harris, ele toca o baixo com uma tamanha velocidade que os dedos nem parecem toca-lo. Iommi, grande responsável pela criatividade sonora e rítmica das músicas, continua impecável. O batera, que vem de uma longa desintoxicação (álcool, segundo as fontes oficiais), não deixou nada a desejar. E Tony Martim, fez tudo que estava ao alcance de suas cordas vocais.
Em resumo: não chegou a ser a Brastemp que se apresentou aqui na última vez com Dio nos vocais - que junto com a apresentação do Jethro Tull no Ginásio do Ibirapuera e Emerson, Lake & Palmer no Palace, considero uma das melhores que já assisti - mas foi bom.
A penúltima apresentação da noite foi do bate-estaca Slayer. Porrada para head-banger nenhum colocar defeito, contudo, por passar a anos luz de distância daquilo que velhos como eu possam considerar agradável de ser ouvido, peço licença para omitir minha opinião.
Mas o que realmente arrebentava qualquer um, não era tanto suportar ouvir os grupos que não interessavam, nem as arquibancadas duras, nem alguns atos de vandalismo esparsos entre a multidão que se acotovelava no gramado; mas sim, o intervalo entre um grupo e outro. Os brasileiros tocaram em média meia hora e levavam em média 35 minutos para desmontar e montar novamente o palco. Os internacionais tocavam mais de uma hora e levavam no mínimo 50 minutos para a montagem dos equipamentos. Isso significa dizer que passamos aproximadamente 7 horas vendo neguinho carregar coisas de um lado para outro. Como se isso não bastasse, o vento frio estava de congelar os ossos, e lá pelas tantas, São Paulo resolveu mostrar porque é conhecida por terra da garoa...
A última apresentação foi de um dos maiores símbolos do rock-pose de todos os tempos. Seu som tem uma identidade própria e talvez por isso mesmo se destacam dos grupinhos do mesmo gênero que caem no esquecimento com a mesma velocidade com que aparecem. Fazem um hard de boa qualidade, cuja competência é comprovada pelos seus mais de 25 anos de carreira, conquistando fãs de diferentes gerações.
Já passava da meia-noite quando o Kiss entrou no palco. Infelizmente, ficou longe das apresentações apoteóticas que os primeiromundistas estão acostumados a ver, com chamas enormes com mais de 5 metros de altura em diversos pontos do palco, causando explosões que podem ser facilmente ouvidas nas gravações ao vivo.
Mesmo sem muitos efeitos visuais e nem um único tirinho de rojão, o show transcorreu eletrizante e bem agitado. Tocaram basicamente o repertório do seu último disco ao vivo Alive III que reúne principalmente hits dos anos 80 e alguns dos 70. O baixista Gene Simons, bem mais comportado, não ficou mostrando aquele linguão indecente para o povão, mas como não podia deixar de ser, em certo momento do show, pegou uma espada em chamas e cuspiu uma bela chama de quase 2 metros na direção de uma das laterais. O guitarrista Paul Stanley também não deixou passar em branco: durante a música Lick it up entraram no palco algumas modelos que simularam um streep tease, e depois de deixar uma das garotas quase nua, convidou as tietes à tirarem a roupa e mostrarem o que têm de bom para eles e os companheiros delas. Se não fosse o frio miserável que estava fazendo, elas bem que teriam topado.
Não tocaram Rock and Roll all Nite, nem God Gave Rock 'n' Roll to You, mas tocaram a deliciosa Love Gun e surpreenderam com a antiga Black Diamond. O show fechou com Heaven's on Fire e uma tímida chuva de prata no fundo do palco simulando o fire.
Será que algum dia veremos um show aqui igual ao que apresentam lá fora ?
Haha! Quando escrevi este texto na época da faculdade havia esta dúvida, mas o tempo mostrou que sim!!!
Ricardo Koetz
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