Riverside - Overload Fest

OVERLOAD Music Fest 05/09/2015 - Via Marques
 
Em primeiro lugar é preciso tirar o chapéu para o Lucas, que teve a coragem de organizar um evento desse porte, com tantas bandas, ainda mais numa época como essa. Um sujeito de coragem e que, mesmo com bom público, provavelmente fechou sua contabilidade no vermelho. É um tipo de pessoa que faz as coisas pelo amor à música e não com o intuito de ganhar dinheiro. No final, tomei a liberdade de adicionar um texto dele, que é muito instrutivo.




Em segundo lugar, é preciso levar em consideração que este que vôs escreve não estava familiarizado com nenhuma das bandas que se apresentaram, exceto o Riverside, motivo que me levou até lá, portanto, as impressões que coloco talvez fossem diferentes se eu tivesse maior afinidade com o que rolou.
 

Em terceiro, eu estava psicologicamente preparado para entrar numa viagem progressiva, mesmo que fosse na linha do new-prog, o que, na minha opinião não aconteceu, exceto pelo Riverside, que, por sinal, se propôs a receber todos os interessados para tirar fotos e dar autógrafos.
 
Novembers Doom. O primeiro show começou pontualmente às 16:30.



No rock, músicas que começam lentas geralmente são uma brasinha, que em pouco tempo cria chamas e se transforma numa fogueira. Tocaram um monte de musiquinhas lentas e mornas, parecendo o começo de Silent Lucidity do Queensryche, muito bonitas, mas as músicas se mantinham contidas até o final, eu ficava esperando o incêndio, mas ele nunca veio. Eles estavam fazendo um show "acústico" e no dia seguinte iriam fazer o show "normal" onde os vocais agradáveis seriam substituídos pelo gutural, alertaram-me, são 8 ou 80. Concluo que tive sorte por estar presente no dia do "8".

Andy McKee


Um virtuoso do fingerstyle, de olhos fechados você poderia jurar que tem dois ou três violões tocando, quando você abre os olhos vê apenas um homem e um violão. Procura aquela deusa da Índia com vários braços ou um polvo, mas é apenas um cara tocando com duas mãos - sem dúvida - um violonista extraordinário.



No entanto, com o meu espírito inquieto esperando viver uma viagem de múltiplos instrumentos através de uma pluralidade de sons, achei interessante, por uns "15 minutos". Num outro contexto, preparado para algo mais light, sentado e sem a expectativa de ouvir ao Riverside, provavelmente o teria apreciado bem mais. Acima ele esta usando o que ele chama de Harp Guitar, um violão e uma "harpa" onde estão cordas grossas que fazem o som de um baixo.

Riverside



Finalmente eu estava em terreno conhecido, apesar de não conhecer muito do trabalho deles, sem dúvida se tratava de uma sonoridade intrincada com a qual eu estou mais habituado. Me lembra outra banda polonesa que gosto muito, Collage.


Um vocal agradável e um baixo esplêndido tipo "Eloy", nas mãos do líder Mariusz Duda.



Uma guitarra de timbre quase floydiano com o habilidoso Piotr Grudziński.


Completam o time o baterista Piotr Kozieradzki...


e o tecladista Michal Łapaj. Grande show! 
 
The Reign of Kindo



Com uma passagem de som interminável, eu já estava perdendo a paciência. Quando começou, meu ouvido incauto identificou uma mistura de George Benson com Steve Wonder e Simply Red. Com a força da bateria conjugada com a percussão, se tornou um progressivo, se é que pode ser chamado assim, meio caribenho, meio bossa. Quando entra a parte instrumental fica bem legal e daí eu penso agora vai, mas acaba antes de você conseguir falar pausadamente paralelepipedo. Foram aplaudidos com entusiasmo por quase 50% dos presentes, mas eu me sentia um peixe fora d'àgua.

Anathema



O rock progressivo tem por característica principal a alternância e imprevisibilidade da música, muitas nem refrão têm, ou seja, uma surpresa a cada instante. Depois de mais uma interminável passagem de som, a banda Anathema se apresentou andando no sentido contrário do que eu esperava, no início me lembrou até o U2 pela sua guitarra minimalista e vocal. O fato é que eles abusam da repetição de sequências sonoras, entrando numa espécie de hipnotismo e acabam criando sua viagem em cima desse "mantra". Outra coisa que me incomodou, e a alguns presentes também, foi um certo teclado "fantasma" que tocava sozinho. 


Possuem músicos competentes, além do vocalista principal, uma vocalista de voz agradável, mas não fui seduzido pelo som que fazem, o que não significa que minha opinião possa mudar de acordo com a minha maior familiarização com seu trabalho.

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Se quiserem ler uma resenha decente sobre esse show, leia o link do Diego Sousa abaixo, que conhece bem as bandas e escreve empolgado sobre o que aconteceu.
 
 

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Outro texto MUITO interessante que eu recomendo é o do produtor desse festival, o Lucas, que mostra como funciona a contabilidade de um show internacional nos moldes dos barzinhos. Se o texto lhe parece longo, leia pelo menos a parte que marquei em azul, é muito instrutivo.
 
"A maior vítima do câmbio

por | ago 8, 2015

O impacto do câmbio no showbusiness é óbvio: cachês, vistos, vôos… Diversos dos principais gastos de uma turnê são em moeda estrangeira (normalmente dólar ou euro). Todos os níveis de eventos são impactados, do show de estádio ao show mais underground imaginável. Porém, nem todos os tipos de evento têm os mesmos mecanismos para combater a crise cambial.

Os shows de grande porte têm muitas formas de se manter competitivos. A flexibilidade vem, principalmente, de dois lados:

– Existe uma gordura para queimar. Um artista que cobra cachê de 100 mil dólares pode fechar um show por 70 ou 80 mil. Pode se viajar com uma produção mais enxuta. Existe onde cortar custos. Cabe aos produtores não entrarem em leilões que inflam os cachês e custos de produção. O próprio real desvalorizado diminui o número de produtoras interessadas em arriscar. Isso naturalmente vai diminuir a demanda por shows internacionais, minimizando o impacto dos leilões. Nos níveis mais altos do showbusiness existem menos players, menos produtoras com cacife para trazer os artistas do primeiro escalão.

– Nos eventos em grandes casas, arenas ou estádios existe uma maior tolerância com os altos preços dos ingressos. As produtoras conseguem diminuir o impacto do dólar mais caro subindo o preço dos ingressos.

Eventos de pequeno porte não têm estes mecanismos. O underground funciona sem nenhuma gordura para queimar: os cachês são baixos, as produções não têm luxo, as equipes são mínimas (de vez em quando artistas viajam sem equipe nenhuma!). Quem mais sofre com o dólar a 3,50 é o underground.

Imagine aquele show típico de Hangar 110, Clash Club ou Manifesto. Sabe aquele artista que tem um público fiel de 300, 400 pagantes? Este evento se tornou inviável. O underground não vai pagar 130 reais no Hangar 110. Sim, provavelmente 200-300 pessoas ainda pagariam 130 reais para assistir o Obituary, mas não as 500 que são necessárias para fazer do show algo viável.

Imagine um artista que toque em São Paulo por 6000 dólares, que na cotação atual custaria ao produtor cerca de 22500 reais. Neste evento fictício cobraríamos 90 reais, um preço comum para shows deste porte.

Com 400 pagantes, teríamos uma bilheteria bruta de 36000 reais. Descontando os 22500 de cachê, sobrariam 13500 para bancar os vistos de trabalho, aluguel da casa, hotel, alimentação, transporte, equipe, equipamentos, divulgação, ECAD, impostos e o lucro do produtor. Acredite, com 13500 não é possível bancar todas despesas. Só o ECAD já leva de 5 a 10% da bilheteria.

Não tem de onde cortar custos, e 6000 dólares em São Paulo é muito pouco dinheiro para uma banda média. O agente vai tirar ao menos 10% de comissão, a banda tem que pagar sua equipe e os vôos. Mesmo em uma turnê extensa pela América do Sul, o rateio dos vôos irá custa ao menos alguns milhares de dólares por show. Ou seja, destes 6000 a banda não vai ficar com mais de 2000, que ainda tem que ser dividido entre quatro, cinco ou seis caras (oito, se for uma destas bandas novas de folk metal). Mais uma vez, acredite: aquela lenda do metal que você tanto admira está tirando 300, 400 dólares para tocar ali para você. O motorista da van leva mais dinheiro para casa que o vocalista.

A solução seria subir o preço dos ingressos. Mas também já estamos trabalhando com extremos. O público irá rejeitar um evento de mais de 100 reais no Hangar 110. Não tem para onde fugir.

É provável que o impacto seja imediato. Os shows pequenos de heavy metal e punk irão diminuir consideravelmente, incluindo as bandas clássicas que batem ponto por aqui. Estilos mais extremos são ainda mais sensíveis a mudanças no preço dos ingressos. Death e black metal vão sumir da agenda cultural brasileira. Simplesmente não é viável.

Um nível acima, os shows do Carioca Club ou Via Marquês contam com um pouco mais de recursos para combater a crise, principalmente o preço dos ingressos. É possível cobrar 120 ou 130 reais nessas casas e ainda ter um público satisfatório. A situação também não é fácil, já que diversos artistas levaram menos público em 2015 do que em turnês anteriores. Em shows deste porte também existem mais produtores interessados, o que complica negociações por cachês mais baixos. O impacto não será tão grande quanto nos shows pequenos, mas acredito em uma diminuição também.

A situação fora de São Paulo será ainda mais grave, principalmente no Rio de Janeiro. A cidade sempre teve custos de produção muito altos e uma margem de lucro pequena. A cidade não tem capacidade para aguentar o tranco de um câmbio pouco favorável. O número de shows internacionais no Teatro Rival Petrobras, Circo Voador e Fundição Progresso irá diminuir consideravelmente. O Teatro Odisseia será o grande vencedor neste cenário, já que é a casa mais acessível da cidade. Porém, não são todos os artistas que aceitam as condições limitadas da casa. Cidades como Belo Horizonte e Curitiba, apesar de públicos irregulares, podem se beneficiar por serem cidades mais baratas.

Poucas bandas querem vir ao Brasil para fazer um único show em São Paulo. Por isso outras praças ainda irão continuar no roteiro. O produtor tem que incluir Rio ou Porto Alegre na turnê para conseguir fazer São Paulo. E muitas vezes estes shows são deficitários, mas necessários viabilizar o show lucrativo em Sampa."

[]'s
 
Ricardo

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