Central Park
Conheço pessoas que têm restrições quanto a viajar para os EUA pelos mais diversos motivos. Os místicos dizem que o lugar é amaldiçoado, negativo, tem atmosfera pesada por sei lá eu o quê. Outros têm a certeza de que a qualquer momento vai haver um terremoto que irá varrer o país do mapa, apesar de apenas um pequena parte do país estar em cima de uma falha geológica... Muitos acreditam que o capitalismo seja o verdadeiro satã que oprime os fracos e comprimidos, e geralmente têm uma simpatia pelo comunismo recalcado que faliu no mundo inteiro e impediu o desenvolvimento de suas nações por décadas e mais décadas, cobrando um preço alto demais de várias gerações de seus pobres habitantes. Conheço um empresário que disse se recusar a ter que pedir licença para eles, para poder gastar o dinheiro dele lá... enfim, os meus motivos eram muito mais simples, sempre achei que a Europa é mais interessante que os EUA.
Manhattan vista do Rio Hudson, com as torres em contrução.
Apesar da burocracia criada por seus impiedosos governantes, de serem os grandes opressores do mundo, a moradia do capeta, de um dia acabar em ruínas por força da natureza ou pela mão de Deus que cobrará deles as mazelas do mundo, ouvi muitos dizerem que é uma região habitada por pessoas de carne e osso :-), de lindas paisagens, com uma das mais famosas cidades do mundo, que não é chamada de Big Apple à toa - e é isso que eu fui visitar, despindo-me de tudo que é obscuro e abstrato. Para mim, bandeiras, fronteiras e nomes são coisas criadas pelo homem. Não estou indo visitar o imaginário de alguém, mas sim uma formação geográfica que tem terra, água, verde, luz e, é claro, concreto, como aqui. Não fui conhecer o apocalipse nem o carrasco do mundo :-), apenas uma região bonita e uma cidade que tem muitos atrativos.
Mesmo assim, tinha muitos receios. Quem nunca ouviu falar da arrogância dos americanos (estadunidenses)? Sobre o preconceito racial em que brancos e negros (agora afro-americanos) não podem falar um com o outro? Sobre os Estados Unidos quererem ficar dando palpite na preservação de nossas florestas depois de terem detonado as deles? Bem, tinham me dito tudo isso e tive grandes surpresas.
Central Park visto do Top of the Rock
Chegamos pelo aeroporto JFK em NY e logo pegamos o metrô. Eu tinha feito a lição de casa, levei o mapa do metrô, mapa das ruas de Manhattan, Brooklin e Queens, mapeei os lugares a serem visitados, estações mais próximas, etc. Mas ao vivo é diferente da internet, por via das dúvidas, perguntei como chegava a uma estação qualquer e me informaram que bastava pegar o trem correspondente na plataforma abaixo. Descobri a duras penas que em uma única plataforma podem passar trens para quase uma dúzia de linhas e destinos diferentes, e mesmo se você pegar a linha certa, cuidado, poderá pegar um expresso, que só para em algumas estações. É claro que pegamos o errado e foi aí que tive minha primeira e agradável surpresa. Ao pedir informação numa estação completamente fora de minha rota de destino, foi uma senhora afro-americana simpaticíssima que ofereceu ajuda. Foi normal estarmos perdidos com um mapa na mão e sermos abordados por pessoas, geralmente mulheres e na maioria das vezes afro-americanas, nos oferecendo ajuda. Perguntei a algumas sobre o "problema" racial e Melody, a primeira que nos ajudou, disse num sotaque nova iorquino gostoso e cadenciado, que eu poderia voltar ao Brasil e dizer que isso era uma grande bobagem. Não satisfeito conversei com outras e uma jamaicana, no país a 8 anos, disse que jamais havia notado qualquer tipo de preconceito. Depois que você começa a entender como as mais de 20 linhas funcionam, você começa a adorar o sistema.
Empire State visto do Top of the Rock
Manhatan tem a Vila Madalena, o centro velho, a Liberdade (mas chinesa), o Bixiga, o fim da Brigadeiro Luiz Antonio, quase o mundo todo, concentrado numa ilha infinitamente menor que a cidade de São Paulo. Alguns lugares fedem igualzinho às redondezas dos mercados municipais. Tem linhas de metrô novinhas e outras sombrias e mal cheirosas. No Queens tem até uns caras no farol com rodinho tentando lavar o vidro dos carros nos faróis - não acreditei. A comida, bem... no Queens, não dá coragem de entrar em lugar nenhum para comer, são nojentos. Arriscamos entrar numa espécie de Bob's pequeno, a indiana não conseguia falar inglês direito, não tinha banheiro, nem mesmo uma pia para lavar as mãos, além de nos vender um hambúrguer à mais. O mercadinho perto do hotel parece uma espelunca, pior que mercadinho de bairro de periferia - corredores estreitos, produtos empilhados pelo chão, prateleiras caindo. Compramos uma espécie de raspadinha sem-vergonha, horrível, custou 5 dólares. Não satisfeito, compramos um sorvete que é vendido numa rede de caminhõezinhos parados por aí. Mais 5 jogados fora. Felizmente achamos um restaurante indiano perto da Wall Street por pound muito bom, perto do que tínhamos encontrado até então.
O mais difícil é encontrar alguém estadounidense de verdade. Em dois dias falei com indianos (dominando todos os postos de negócio), chineses, hispânicos... Já estava achando que não tinha mais americano por aqui, até que usei os serviços de uma espécie de taxista, de 75 anos, nascido em NYC. Comemorei, mas ele estava trabalhando para um empresário - RUSSO!!!
Ao experimentar a "Big Apple" e ser imediatamente seduzido por ela, passeamos pela cidade num ônibus aberto no segundo andar e mesmo ao lado do cano de escapamento de outros ônibus, nenhuma vez senti qualquer cheiro de poluição. Quando saímos da cidade rumo à Niagara Falls, esperava encontrar uma periferia devastada e pouca área verde. Assim que saímos da ilha de Manhattan, rodamos quase 600Km no meio do verde. Não me refiro ao deserto verde que temos aqui em São Paulo e na maioria dos estados, que se restringem à monocultura da cana de açúcar, eucalipto para corte, ou pasto com alguns tufinhos de mata. Lá andamos isso tudo por estradas de longas retas, curvas leves e monótonas florestas por ambos os lados. Cruzei os estados de Nova York e Pensilvânia, com florestas por todos os lados. Cheguei a ver um veadinho morto, entre outros tipos de animais silvestres, vítima de atropelamento.
Foi no show do Kansas, ao lado das Cataratas do Niágara, que vi um sinal que poderia ser interpretado como pouco amistoso, um cara usando uma camiseta que dizia "Bem-vindo à América, agora fale inglês", por outro lado vi duas que diziam "Somos Todos Africanos".
Estranhei a ausência total de afro-descendentes nas bandas que assisti, também eram raros entre a platéia. Outra diferença, pouca gente fotografando ou filmando.
No Brasil quando vou a shows, independentemente se são de Metal, Hard Rock, Progressivo ou Jazz, a presença de jovens é tranquilamente superior a 50%. Em todos os shows que vi nos EUA, a esmagadora maioria era de pessoas na média dos 50 anos ou mais. Me preocupou a falta de renovação desse público, apesar de as bandas serem formadas por jovens. Para quem eles irão tocar daqui a 20 anos?
Em Nova York vi poucos obesos e, em geral, muito pouca gente fumando. Mas esse mundo está longe de ser perfeito, na foto acima estamos numa das principais avenidas de NYC, a Broadway, e tem camelô e uma pessoa revirando o lixo.
Central Park
Dirigir lá também é muito estranho. Se você estiver andando por uma estrada ou rua e tiver uma placa Stop, mesmo que você tenha uma visão de 5Km para cada lado e não venha ninguém, pare! Eu não disse reduza a velocidade, eu disse pare e depois continue. Se já tiver um ou mais carros parados, PARE! Eu pensava que estavam parados para me deixar passar, mas não é isso. Você pára, daí o primeiro que parou anda, depois o segundo que parou anda e por último você. Se você estiver numa faixa e quer mudar para outra, cuidado, é preciso esperar pacientemente até que alguém deixe uma longa distância entre um veículo e outro. Não tente aproveitar uma brecha como eu, levará um buzinaço. Arrependido, baixei o vidro, levantei a mão para pedir desculpas - jamais faça isso! Não sei o que a mão levantada significa para eles, mas deve ser ofensa grave. O cara que estava de passageiro soltou o sinto de segurança, virou de costas, ajoelhou-se em cima do banco, baixou as calças e encostou a bunda pelada no para-brisas do carro e o motorista deu outro buzinaço. Foi fantástico, tentei fotografar mas não deu tempo, o carro nos ultrapassou com dedo do meio da mão direita do motorista em riste, foi muito legal, mas não recomento que ninguém repita a minha manobra. Isso aconteceu numa pacata cidadezinha do interior da Pennsylvania.
NYC está em obras e esta é uma das 5 torres que estão sendo construídas, para substituir as duas derrubadas.
Fiquei sabendo de três endereços de que tinham blues ao vivo, mas normalmente às 21hs, com o dia quase escuro, já estávamos moídos e não deu para frequentar, infelizmente.
Ricardo
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